Crimes financeiros cometidos no exterior podem ser julgados no Brasil
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou habeas corpus para trancar ação penal contra os representantes da empresa offshore Business Properties Inc., sediada nas Ilhas Virgens Britânicas, um paraíso fiscal do Caribe. “Para que se possa reconhecer a ausência de justa causa, com o consequente trancamento da ação penal, é necessário que a simples leitura das peças trazidas ao conhecimento do julgador deixe transparente a certeza de que o acusado não cometeu qualquer infração”, disse o relator do caso, desembargador convocado Adilson Macabu. Os dois representantes da empresa foram denunciados perante a 2ª Vara Criminal da Justiça Federal em São Paulo, por infração à Lei n. 7.492/1986, que trata dos crimes contra o sistema financeiro nacional. De acordo com a denúncia, eles teriam mantido recursos no exterior sem declaração às autoridades brasileiras, além de operar instituição financeira sem a devida autorização. As atividades suspeitas foram descobertas durante investigações do caso Banestado, em que se apuraram responsabilidades por evasão de divisas ocorrida em 1996 e 1997. Segundo o Ministério Público, ao coletarem provas do escândalo em Nova Iorque, os investigadores descobriram contas bancárias movimentadas por pessoas residentes no Brasil. Uma dessas contas, do MTB Bank, de Nova Iorque, pertencia à Business Properties Inc., empresa aberta em 2001 nas Ilhas Virgens Britânicas. De acordo com laudo juntado à denúncia, teria havido intensa movimentação da conta até 2003, atingindo mais de US$ 2,5 milhões. O próprio MTB Bank, segundo consta do processo, teria informado que a conta servia para que os denunciados intermediassem com o banco os negócios de seus clientes. Para o Ministério Público, a existência de um sistema constante de crédito e débito, envolvendo recursos elevados, caracteriza o funcionamento de uma instituição financeira por equiparação, além do que os representantes legais da empresa nada informaram às autoridades brasileiras sobre a manutenção desses valores no exterior. Os dois acusados já haviam tentado, sem sucesso, obter o habeas corpus no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), sediado em São Paulo. Eles pretendiam que a ação penal fosse anulada, por falta de justa causa, ao argumento de que os atos eventualmente praticados não se enquadravam na tipificação penal apresentada pela denúncia. Denegada a ordem, repetiram a tentativa no STJ. No entendimento do desembargador convocado Adilson Macabu, as condutas descritas pelo Ministério Público apontam, de forma suficiente, “ainda que mínima”, a existência de indícios capazes de justificar a ação. “O trancamento da ação penal em sede de habeas corpus constitui medida excepcional que somente se viabiliza quando, de plano, fica revelada a falta de justa causa para seu prosseguimento”, disse ele. Segundo o relator, a alegada falta de justa causa teria de ficar demonstrada “em razão da ausência de fato típico imputado aos denunciados ou de elementos que emprestem alguma base à investigação”. Na avaliação do magistrado, cujo voto foi seguido de forma unânime pela Quinta Turma, as condutas apontadas não são atípicas e a denúncia oferecida à Justiça contém “os elementos mínimos necessários à busca da elucidação do possível crime”.