Princípio da insignificância se aplica aos crimes de descaminho
Supremo e STJ livram importador de ação penal Arthur Rosa | De São Paulo 15/03/2011 Os tribunais superiores estão livrando, com base no princípio da insignificância, acusados de crime de descaminho – importação de produtos sem o pagamento de impostos -, desde que o valor sonegado seja inferior a R$ 10 mil. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio de recurso repetitivo, resolveu adotar entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), baseado no artigo 20 da Lei nº 10.522, de 2002 – com a redação dada pela Lei nº 11.033, de 2004 -, que estabelece uma espécie de perdão fiscal para pequenos devedores. Até então, o limite utilizado pelo STJ era de R$ 100.A maioria dos ministros da 3ª Seção do STJ não concorda com a tese do Supremo, mas resolveu adotá-la “em prol da otimização do sistema”, para evitar uma “sucessiva interposição de recursos”. Pedidos de habeas corpus contra prisões resultantes de furto de objetos de pequeno valor ou de delitos de descaminho (artigo 334 do Código Penal) estão constantemente na pauta dos tribunais superiores. Entre 2008 e 2010, o STF recebeu 340 recursos pleiteando a aplicação do princípio da insignificância ou da bagatela – quando o potencial ofensivo do ato é levado em conta para descaracterizar o crime. Apenas 91 pedidos foram concedidos (26,76% do total). Nos casos de pequenos furtos, os ministros dos tribunais superiores analisam caso a caso a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância – que não está previsto expressamente na lei brasileira. Nem sempre o valor do bem furtado é determinante. Se o infrator for reincidente, a chance de liberdade é pequena. Recentemente, a 1ª Turma do Supremo negou o pedido de habeas corpus feito pela Defensoria Pública da União para uma mulher acusada de furtar itens de pequeno valor em três episódios diferentes. Ela teria roubado R$ 10,00 de uma carteira e, em um outro momento, levado oito pares de meia, três cuecas, um maço de cigarro e um pacote de balas pertencentes a uma outra vítima. Esses itens foram avaliados em R$ 98,35. Em outra oportunidade, levou as compras de uma outra pessoa (alimentos e produtos de limpeza), avaliadas em R$ 149,70. Nos casos de descaminho, decidiu-se estabelecer um limite. Os ministros do Supremo argumentam que não há sentido permitir que alguém seja processado criminalmente pela falta de recolhimento de um tributo que não se tem a certeza de que será cobrado. O assunto dividia os integrantes da 5ª e da 6ª Turma do STJ, que formam a 3ª Seção. A 6ª Turma entende que é possível adotar o artigo 20 da Lei nº 10.522, que permite o arquivamento dos processos de execução fiscal com débitos iguais ou inferiores a R$ 10 mil. Para a 5ª Turma, no entanto, esse arquivamento não significaria a extinção de um crédito tributário. A Fazenda Nacional poderia cobrar o valor devido posteriormente, desde que o somatório das dívidas do contribuinte ultrapasse R$ 10 mil. A 3ª Seção chegou a adotar o entendimento que prevalecia na 5ª Turma, baseado no artigo 18, parágrafo 1º, da Lei nº 10.522. O dispositivo determina o cancelamento de dívida tributária igual ou inferior a R$ 100. Posteriormente, para evitar que os casos de descaminho fossem se acumulando no Supremo, os ministros do STJ resolveram reavaliar a questão e aceitar o teto de R$ 10 mil. “Com tantos processos pendentes, era absurdo o STJ não seguir o posicionamento do Supremo”, diz o advogado Luiz Flávio Gomes, especialista em direito penal. “Uma pessoa tinha que passar pela primeira instância e três tribunais para obter uma decisão final favorável”. A tese vencedora foi levada aos tribunais superiores pela Defensoria Pública da União. “Não há sentido se mobilizar o Judiciário para a análise desse tipo de caso. A própria Fazenda Nacional não tem interesse em reaver esses créditos”, afirma o defensor público designado para atuar no Supremo, Gustavo de Almeida Ribeiro, lembrando do custo de um processo nos tribunais superiores. No STJ o gasto é em torno de R$ 2 mil por ação. Já no STF, quase R$ 4 mil.