Projeto de Lei anistia recursos enviados ao exterior
Dinheiro ilegal no exterior pode receber anistia Fonte: CONJUR O Projeto de Lei 354/09, conhecido como Projeto de Cidadania Fiscal, que concede vantagens fiscais para facilitar a repatriação de valores mantidos no exterior e não declarados à Receita, pode ser votado neste mês na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. De autoria do senador Delcídio Amaral (PT-MS), a proposta tem sido alvo de críticas daqueles que acreditam que, se aprovada, a propositura vai “deslavar” dinheiro de brasileiros sonegadores e beneficiar quem mandou para o exterior valores obtidos por meio do tráfico de drogas, lavagem de dinheiro, corrupção e crimes financeiros. De acordo com o texto, pessoas físicas e jurídicas que tenham no exterior dinheiro ou bens de origem legal não declarados à Receita poderão incluir esses valores nas declarações de 2011, ano-base 2010, caso ele seja aprovado ainda este ano. O imposto será de 5% em cota única ou de 10%, se for parcelado, sobre o valor repatriado. A proposta já recebeu parecer favorável do relator na Comissão de Constituição, Justiça (CCJ), o então senador Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), que agora chefia o Ministério da Previdência. Garibaldi apresentou 13 emendas ao texto original, entre as quais a que diz respeito ao tipo de crime a ser perdoado, caso o titular do patrimônio aceite as regras do retorno. A sugestão do relator é a de que a anistia alcance apenas o delito de evasão de divisas, um dos antecedentes para a caracterização do crime de lavagem de dinheiro, perdoado pela proposta original. A emenda do relator também permite que a tributação seja reduzida pela metade se o contribuinte aplicar no mínimo 50% do valor dos bens e direitos em cotas de fundos de investimentos dirigidos a projetos de infraestrutura, habitação, agronegócio, inovação e pesquisa científica ou em bônus e títulos de dívida de empresas brasileiras no exterior. No caso de pessoa jurídica, a regularização se dará pela incidência do IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), com alíquotas de 10% e 8%, respectivamente. Após passar pela Comissão de Assuntos Econômicos, em caráter terminativo, o projeto seguirá para a Câmara dos Deputados. Origem do dinheiro Apesar de o artigo 9º do projeto excluir do rol de delitos perdoados os crimes previstos na Lei 9.613/98, que dispõe sobre a lavagem ou a ocultação de bens, direitos e valores, a proposta é alvo de críticas por não esclarecer como será comprovada a origem do dinheiro nem como ele foi parar no exterior. “Fica extinta a punibilidade dos crimes com a simples declaração dos bens e valores, não havendo obrigação legal de se comprovar se os recursos são ou não lícitos. Dessa forma, o projeto acaba premiando aqueles que não estão seguindo a lei. Tem muito dinheiro não declarado fora do país proveniente de lavagem de dinheiro e do tráfico de drogas e de armas”, explicou o delegado da Polícia Federal Bruno Titz de Rezende, que atua na Delegacia de Repressão a Crimes Financeiros em São Paulo. Segundo o delegado, a maior parte dos recursos mantidos fora do país ilegalmente por brasileiros foi enviada para o exterior há muito tempo, por isso, muitos crimes de evasão de divisas podem estar prescritos. Mesmo assim, a manutenção de dinheiro não declarado no exterior é crime permanente, com prescrição contada a partir do momento em que os recursos retornam ao Brasil. “Ou seja, com a aprovação do projeto, o contribuinte não poderá mais responder pela manutenção ilegal do dinheiro. Haverá uma anistia penal e o ordenamento jurídico não mais permitirá a punição dos crimes dessa espécie cometidos antes da edição da lei”. O delegado também destacou que o projeto propõe uma inversão de valores, uma vez que quem aufere renda no país e o declara paga uma alíquota maior do que aquele que manteve recursos ilegais no exterior. “As alíquotas do Imposto de Renda vão até 27,5%, mas para quem participar desse projeto de ‘cidadania fiscal’, a alíquota será de no máximo 10%. O projeto representa um retrocesso. Enquanto países, como os Estados Unidos, estão ampliando o combate aos crimes financeiros e tributários, o Brasil avalia a possibilidade de premiar quem não cumpre a lei”. Preocupada com a possibilidade de tratamento benéfico ao dinheiro que vai para o exterior de forma criminosa, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) entregou uma nota técnica a todos os senadores. A entidade acredita que haverá grande dificuldade para discriminar a natureza e a origem do dinheiro repatriado. O presidente da Ajufe, juiz Gabriel Wedy, chegou a considerar que o projeto viola o princípio constitucional da moralidade e que o envio de dinheiro ao exterior é feito geralmente por organizações criminosas. “O dinheiro da corrupção na política brasileira é obviamente encaminhado de forma ilícita.” O promotor do Patrimônio Público e Social de São Paulo, Silvio Marques, também levantou a hipótese de a constitucionalidade da lei ser questionada, caso ela seja aprovada. “A legislação já permite que o contribuinte que sonegou não responda criminalmente, caso ele pague todos os tributos. Por outro lado, não acho que seja justo uma lei beneficiar quem não declarou seus bens no exterior em detrimento dos que cumpriram suas obrigações no Brasil, que não vão ter uma alíquota menor”, explicou. “A proposta pode até ter um resultado inverso, uma vez que demonstra ser vantajoso o envio e a manutenção de dinheiro não declarado no exterior.” Ele avaliou ainda que é preciso deixar claro como será feita a repatriação dos recursos, para que não sejam beneficiados contribuintes que não declararam dinheiro de origem ilícita. “O projeto não pode abarcar esse tipo de bens. Seria a mesma coisa que lavar dinheiro com a chancela da lei.” Na vertente oposta, o advogado tributarista Raul Haidar considerou boa a intenção do PL 354/09, por viabilizar o retorno de dinheiro que foi para fora do país. “As críticas giram em torno da origem dos recursos, da possibilidade de eles serem fruto de atividade ilícita. É melhor que esse dinheiro fique aplicado no Brasil para pagar imposto e gerar