Empresas brasileiras usam importação como defesa
As empresas brasileiras, conforme destaca a reportagem abaixo, passam a fazer uso da importação como rota de fuga ao famoso “custo Brasil”. Ou seja, ainda que se considere o aumento das importações como grande vilão da indústria nacional, o que se identifica é que o grande vilão é, de fato, nossa carga tributária, nossos custos trabalhistas, dentre outros entraves, como logísticos e financeiros. Ou seja, de nada adianta criar mecanismos para encarecer as importações, se não entrarmos no âmago da questão “Custo Brasil”. Importação vira defesa contra alta de custos SÃO PAULO – De 2005 a 2011, a tarifa da energia elétrica industrial subiu 28%. No mesmo período, a folha de salários da indústria aumentou 25% acima da inflação. Com a valorização do real, esses e outros custos de produção ficaram ainda mais pesados, tornando os produtos domésticos mais caros, seja no mercado interno, seja na exportação. Em dólares, a energia subiu 86% e a mão de obra, 57%, já descontando os ganhos de produtividade. O aumento dos custos industriais foi paulatino. Enquanto eles subiam, a indústria adotou estratégias de defesa que acabaram por afetar o próprio setor. Elas buscaram fornecedores mais baratos no exterior, montaram unidades fora do país e desviaram as vendas ao exterior para o crescente mercado doméstico. No conjunto, as estratégias contribuíram para que a própria indústria se tornasse um grande importador e um exportador menor, compensando a perda de 13,5% na rentabilidade das exportações de 2004 a 2011. Nas contas do Ministério da Fazenda, enquanto o superávit comercial do Brasil foi de US$ 29,8 bilhões, a indústria de transformação teve déficit próximo a US$ 90 bilhões. A fabricante de compressores Bitzer e a Stanley Black & Decker optaram pelo aumento da importação como solução mais imediata para a alta de despesas. Em 2004, a Bitzer importava 30% dos insumos que consome no processo produtivo. Hoje, essa fatia fica entre 60% e 70%. Já a Weg driblou a diferença de custos principalmente apostando na produção fora do país. Das receitas oriundas do exterior, a fatia das subsidiárias subiu de 10% em 2009 para 22% em 2011. As estratégias de defesa da indústria, combinadas com o menor crescimento mundial e também com a desaceleração da economia doméstica, levaram à estagnação da produção industrial em 2011 e ao menor percentual de participação do setor no Produto Interno Bruto (PIB). Na sequência, voltou o debate sobre o risco de desindustrialização, e o governo reforçou medidas para conter a valorização do real e de proteção à indústria. Na Bitzer, a importação de insumos se aproxima dos 70%. “Infelizmente foi a solução que adotamos para reduzir custos”, diz Fernando Bueno, presidente da empresa. Segundo ele, a empresa traz da Alemanha desde insumos mais sofisticados, como peças de alumínio bruto, até parafusos. Esses últimos chegam ao Brasil com um terço do preço do fabricado no país. “Fizemos isso para sobreviver e deixamos de comprar da indústria nacional, que pode desaparecer. ” O presidente executivo da Dedini Indústrias de Base, Sérgio Leme, diz não ter dúvidas de que o país vive um processo de desindustrialização. “A elevação de custos, o câmbio e a carga tributária tornam muito difícil para a indústria competir.” De forma semelhante à Bitzer, uma das principais armas da Stanley Black & Decker tem sido o aumento das importações, tanto de produtos acabados como de componentes. O vice-presidente de operações para a América Latina, Domingos Dragone, conta que, há cerca de oito anos, a fabricante de ferramentas e eletrodomésticos produzia no Brasil de 70% a 80% dos bens acabados e importava os outros 20% a 30%. Hoje, o mix praticamente se inverteu. Cerca de 60% a 70% dos bens vêm de fora, em grande parte de plantas da Stanley Black & Decker no exterior, especialmente da China. Os outros 30% a 40% são feitos por aqui. “Nós jogamos a regra do jogo”, diz Dragone. A empresa também elevou a fatia de componentes importados nos produtos fabricados no Brasil. Há oito anos, o percentual variava de 10% a 12%; hoje, está entre 25% e 30%. Segundo Dragone, essa estratégia tem sido fundamental para a empresa manter competitividade. A Bitzer e a Stanley Black & Decker não foram as únicas que foram às compras no exterior. A participação das importações no consumo doméstico de bens industriais atingiu o recorde de 20,4% no terceiro trimestre de 2011. Em 2008, o índice era de 15,3%, segundo dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) em parceria com a Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex). Segundo o executivo da Bitzer, a empresa dá preferência ao produto nacional para até 10% de diferença no preço em relação ao importado. Mas a diferença, diz, costuma ser de pelo menos 30%. Dados da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas (Abimaq) mostram a evolução de preço da chapa grossa de aço laminado a quente. Em 2004, o aço importado e o nacional tinham preços semelhantes. Em 2011, o aço doméstico tinha um preço 75,5% maior que o de sete anos atrás, enquanto o preço do importado subiu 38,2%. Mesmo com o aumento de custos, a indústria manteve margem de lucro ainda relevante. Levantamento do Valor com amostra de 85 indústrias de capital aberto revela que a rentabilidade fechou em 15,4% em 2011 (considerando 12 meses encerrados em setembro), uma retração de cinco pontos percentuais em relação a 2005. O custo da mão de obra industrial brasileira ficou em US$ 10,08 a hora em 2010, ainda bastante inferior ao de países desenvolvidos, como os US$ 34,74 dos EUA e os US$ 43,76 da Alemanha, segundo números do Departamento do Trabalho dos EUA. Numa lista de 34 países, o custo brasileiro aparece em 28º, mais alto que o de países como México e Filipinas. A China não figura no ranking, porque as estatísticas não são comparáveis, mas o relatório cita um custo de US$ 1,36/hora em 2008. Para o economista David Kupfer, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e assessor da presidência do BNDES, a indústria tem
Pirataria internacional já afeta empresas brasileiras
Até pirulito é pirateado no exterior Por Daniele Madureira | De São PauloEnfrentar a concorrência de importados chineses no Brasil não é novidade para as empresas nacionais. O problema agora está na disputa com a sua própria marca no exterior, pirateada de países como China e Índia. E não se trata de produtos de alto valor agregado, como cosméticos ou roupas de grife. Mas sim de chuveiros de R$ 29, chinelos de R$ 16 e até pirulitos de menos de R$ 1. Esses são os valores dos produtos no Brasil, oferecidos a uma faixa de preço similar em mercados em desenvolvimento, como África e América Latina. Ainda assim, as versões piratas conseguem ser até 50% mais baratas. “Os falsificadores são extremamente flexíveis: fazem uma versão do nosso produto, com o acabamento e a quantidade que o cliente deles quiser”, diz o presidente da fabricante de doces Dori, Carlos Barion. A empresa de Marília (SP), maior produtora nacional de balas e gomas, teve o pirulito Facepop copiado em países da África por indianos. Os dados do fabricante foram omitidos da embalagem. A Dori descobriu a versão falsa quando precisou remarcar o preço do Facepop, por conta da alta do açúcar, e ouviu do seu cliente no Congo que ele conseguia encontrar o mesmo pirulito 50% mais barato. As vendas no país despencaram. “O Congo já representou 10% das nossas vendas na África, mas hoje não chega a 5%”, diz Barion. “No país, nossa venda do Facepop acabou”. O continente africano representa 20% das exportações da Dori, que somaram R$ 45 milhões em 2010. A fabricante, que faturou R$ 429 milhões em 2010, exporta para 45 países, a maioria do Mercosul e da África. Não se trata de um caso isolado. A Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados (Abicab) estuda medidas para coibir a pirataria de marcas nacionais no exterior, que atinge até fabricantes de menor porte como a Riclan, de Rio Claro (SP), e a Jazam, de Pompeia (SP). Nesses casos, a versão pirata mudou de nome. Uma cópia chinesa do pirulito Pop Mania, da Riclan, chegou a Moçambique este ano batizada de “Top Pop”, com a mesma identidade visual e sabores, mas 20% mais barata. A Jazam encontrou há quatro meses uma cópia falsa do seu carro-chefe, o creme de avelã Ducrem. “Descobrimos que importadores chilenos encomendaram aos chineses uma versão pirata do nosso produto, chamada de Tucrema e com preço menor”, diz a gerente de marketing da Jazam, Fernanda Jardim. Por meio do seu distribuidor, a Jazam procurou conscientizar os varejistas da qualidade inferior do produto. Mas as vendas caíram 50% no Chile, segundo a empresa, que tem cerca de 10% do faturamento anual, de R$ 70 milhões, provenientes de exportação. “Não podemos registrar patente em todos os 30 países para onde exportamos, porque o preço do meu produto deixaria de ser competitivo”, diz Fernanda. Mas foi essa a medida encontrada pela fabricante de duchas Lorenzetti para tentar inibir a pirataria. “Nas embalagens das versões piratas das nossas duchas, é copiado não só o endereço da empresa, em São Paulo, como até o selo do Inmetro”, diz o vice-presidente da Lorenzetti, Eduardo José Coli. As versões piratas invadem principalmente as prateleiras de varejistas – inclusive de grande porte – na América Latina. “No México, é comum você chegar a uma grande loja, pedindo uma ducha nossa, e o vendedor perguntar: ‘Quer Lorenzetti ou chino?’”, diz Coli. Para a empresa, a prática não é nova. “Em 2003, fomos para uma feira em Cantão, na China, e descobrimos uma fábrica de produtos com a nossa marca”, lembra Coli. Em 2005, também em uma feira na China, representantes da fabricante encontraram um estande com produtos com o mesmo design que os da Lorenzetti, mas vendidos sob outro nome. “Conseguimos fechar o estande por dois dias, mas o pirateador tirou o miolo do produto e afirmou que nós só tínhamos a patente do mecanismo e não do design e voltou a expor”. A Lorenzetti passou então a acionar escritórios de advocacia em todos os 40 países para os quais exporta e começou a registrar localmente a patente dos produtos. “Conseguimos reduzir bastante as falsificações, mas o preço é alto”, diz Coli. Paga-se cerca de US$ 15 mil ao ano, por produto, no processo de registro de marca e patente em cada país. A fabricante, que deve faturar R$ 700 milhões em 2011, faz 12% das vendas no exterior. Outra medida é usar processos fabris, como injeção assistida a gás, que não conseguem ser copiados pelos falsificadores, pelo alto custo envolvido. “Fizemos isso com a Bella Ducha e o produto não foi pirateado”, afirma Coli. A Alpargatas, dona de marcas como Havaianas, Topper e Mizuno, investe até US$ 4 milhões por ano para monitorar suas marcas em todo o mundo, inclusive no Brasil, diz o presidente Márcio Utsch. “Em Havaianas, também adotamos sinais na sola e na tira que não conseguem ser copiados pelos falsificadores”, diz Utsch. Mas que ninguém duvide da ousadia dos piratas. Até as apostilas da escola de inglês Wizard, do grupo Multi, foram copiadas na China, onde a empresa mantém uma parceria com o governo local.
Empresas brasileiras aderem ao processo de maquila
Paraguai atrai fábrica brasileira com tributo baixo 23/08/2011 LUCAS FERRAZ DE BUENOS AIRES Impulsionado pelos impressionantes 15% de crescimento do ano passado, o Paraguai se tornou um polo de empresas “maquiladoras” na América do Sul com a adoção de um sistema que faz a aliança de imposto mínimo e mão de obra barata. O sistema chamado maquila, implementado há dez anos e que atingiu pico de crescimento no ano passado, se desenvolve com os bons ventos da economia paraguaia e tem atraído inúmeras companhias do Brasil. Já são pelo menos 11 empresas brasileiras ou com capital nacional em atuação no país vizinho. Desde o grupo Cambuci, responsável pela marca esportiva Penalty, a pequenas empresas, como Quality Cotton e Mega Plásticos, instalaram-se no Paraguai e conseguiram reduzir custos. Inspirado no sistema de maquilas do México, que adotou o modelo em meados da década de 90 na esteira da crise econômica que viveu naqueles anos, o sistema paraguaio isenta as empresas de taxas para importar matérias-primas. Toda a produção finalizada no Paraguai deve ser exportada, com exceção de 10%, que podem circular no mercado paraguaio. Essas são as condições do governo para uma empresa ser maquiladora. De imposto é cobrada uma taxa geral de somente 1%. “O sistema tem atraído muitas empresas, mas no Brasil pegou mal o nome; ainda há muita confusão”, diz Wagner Enis Weber, diretor-presidente do Braspar (Centro Empresarial Brasil-Paraguai). “Mas as empresas brasileiras que trabalham com a maquila estão satisfeitas com a redução dos custos”, diz. Implementado em 2001, o regime de maquila começou naquele ano com sete empresas, que exportavam o equivalente a US$ 1,2 milhão. Editoria de Arte / Folhapress RECORDE No ano passado as cifras bateram recorde: US$ 102 milhões, com 49 empresas registradas no Ministério da Indústria do Paraguai. Metade dos bens exportados vai para países do Mercosul, a maioria para o Brasil. Segundo dados da Braspar, empresas como Penalty, Cortinerías del Paraguay e Quality Cotton conseguiram reduzir custos com produção em até 30%, se comparado aos valores do Brasil. Procuradas, as companhias não quiseram falar sobre o regime de maquila. Só Walter Gwynn, um dos diretores da Marseg, empresa paraguaia que produz calçados e luvas de segurança para o Grupo Bertin, respondeu. Disse que a maquila é “altamente benéfica para formar cadeias produtivas tendo como foco principalmente o Mercosul”. O regime de maquilas permite que uma companhia brasileira contrate uma empresa maquiladora paraguaia, que irá produzir com sua marca e depois exportar para onde a matriz determinar. Dessa forma, a Marseg atua para o Grupo Bertin. Outro benefício do Paraguai é o custo trabalhista. Os encargos que incidem sobre o salário de um funcionário são de 30% (incluindo férias, 13º e o equivalente ao INSS), enquanto no Brasil o índice chega a 110%.