Artigo: “Comércio Exterior tem início de ano agitado”
Comércio Exterior tem início de ano agitado Por Adriana Dantas O ano de 2012 começou agitado, com a criação de novas regras e procedimentos que afetam o acesso de importações ao mercado brasileiro. No final de janeiro, a Câmara de Comércio Exterior (Camex) publicou nova resolução que institui o Grupo Técnico sobre Alterações Temporárias da Tarifa Externa Comum do Mercosul (GTAT- TEC). Tal grupo tem como missão analisar pleitos voltados à proteção de setores da indústria doméstica, por meio da elevação temporária do imposto de importação (II) de 100 produtos, com prazo para apresentação de pedidos vigente até o dia 02 de abril próximo. Em um contexto de maior atratividade do mercado nacional a produtos importados, a possibilidade de proteção, em casos em que desequilíbrios comerciais fiquem caracterizados, é bem recebida por setores da indústria mais afetados pela pressão de importações, sobretudo de produtos provenientes da China e do sudeste asiático. Segmentos da economia dependentes de importações, por outro lado, ficam preocupados ante a perspectiva de terem seu negócio afetado pelo aumento de impostos de importação, com impactos econômicos muitas vezes significativos, fruto de um procedimento confidencial, não sujeito ao contraditório. A reunião da Camex de fevereiro resultou na criação do Grupo Técnico de Avaliação de Interesse Público (GTIP), grupo que tende a alterar a dinâmica dos processos de defesa comercial. O GTIP exercerá função distinta à do GTAT-TEC, função essa circunscrita à análise dos impactos da aplicação de direitos antidumping e compensatórios (anti-subsídios) sobre setores da indústria afetados por eventual aplicação de tais direitos. Investigações antidumping e anti-subsídios são conduzidas pelo Departamento de Defesa Comercial (Decom) da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) que elabora parecer determinando a aplicação ou não de direitos antidumping e compensatórios, após análise de dados apresentados no decorrer de um intenso processo investigatório. O parecer do Decom é estritamente técnico e não considera os impactos econômicos mais amplos que a futura restrição às importações acarretará sobre o setor envolvido. Por exemplo, falta de capacidade produtiva, eventuais aumentos sobre os preços de insumos e aspectos concorrenciais não são considerados na análise. Avaliação mais ampla acerca dos referidos impactos econômicos ficava sob a responsabilidade de outro grupo, o Grupo Técnico de Defesa Comercial (GTDC), que, na prática, apenas ratificava o parecer do Decom nos casos de recomendação pela aplicação de direitos antidumping e compensatórios. Já o recém-criado GTIP, grupo integrado por representantes dos sete ministérios que compõem a Camex, institucionaliza o procedimento de análise da suspensão ou alteração de medidas antidumping e compensatórias provisórias e definitivas por razões de interesse público. A institucionalização da cláusula do “interesse público” nos processos de defesa comercial aproxima o sistema brasileiro do europeu. Este inclui a cláusula do “interesse comunitário”, que pode impedir a imposição de medidas antidumping e compensatórias mesmo ante a determinação positiva da prática desleal de comércio, do dano à indústria considerada e do nexo causal entre os dois elementos. No caso europeu, a análise do interesse comunitário integra todas as decisões e, junto com a determinação positiva de dumping, dano e nexo causal, é um requisito para a aplicação do direito antidumping. Na prática, são poucos os casos onde a Comissão Européia concluiu não ser do interesse da União Européia a aplicação de medidas de defesa comercial. Exemplos de casos onde a cláusula foi aplicada são investigações anti-dumping envolvendo importações de salmão do Chile e álbuns fotográficos. Ainda, no caso europeu, o pouco recurso à cláusula do interesse comunitário deve-se, sobretudo, à falta de organização dos setores afetados pelas medidas, ou seja, dos importadores e usuários do produto em questão. No caso brasileiro, a organização desses setores e sua conduta pró-ativa também será fundamental. Com a publicação da Resolução 13 da Camex, de 1o de março de 2012, pedidos de suspensão ou alteração de medidas antidumping e compensatórias deverão ser apresentados à Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda, que coordenará a apreciação dos elementos de fato e de direito que amparam o pedido. Trata-se de inovação importante que permitirá a maior participação do Ministério da Fazenda nesse processo por meio da Seae, que, até então, exercia participação tímida em processos de defesa comercial. Um ponto de destaque é a possibilidade de qualquer membro do GTIP, ou outro órgão da Administração Pública Federal, solicitar, “a qualquer tempo”, informações necessárias à análise. Essa previsão legal tem potencial para gerar confusão tanto para as partes envolvidas, como para a administração pública. Em todo caso, a criação do GTIP e a institucionalização da cláusula do interesse público são sinais positivos para importadores e setores da indústria dependentes das importações, os quais serão mais ouvidos sob o novo mecanismo. A SEAE deverá também trazer elementos da sua experiência em questões concorrenciais para a defesa comercial. Em resumo, enquanto a criação do GTAT-TEC gerou preocupações para os setores dependentes do fluxo continuo de importações, o recém-criado GTIP sinaliza que suas preocupações serão mais ouvidas muito embora em contexto distinto, o dos processos antidumping e compensatórios.
Suposições não são verdades absolutas. E, portanto, não embasam acusação de subfaturamento
Suposições não embasam acusação de subfaturamento Por Raul Haidar O Secretario da Receita Federal anunciou recentemente que será criado um órgão destinado a combater o subfaturamento nas importações. Tal combate teria como alvo principal a importação de mercadorias vindas da China. Declaração atribuida ao secretário menciona o uso de preços menores do que os reais naquelas operações, com o propósito de reduzir os impostos incidentes no Brasil, especialmente o imposto de importação, o IPI e o ICMS. O país importa livremente há mais de vinte anos e a informação traz consigo a falsa idéia de que não haja controle eficaz nessa atividade sob o ponto de vista tributário ou, pior ainda, o registro de que servidores públicos tenham sido negligentes no seu dever de fiscalizar. A fiscalização como regra tem sido eficaz. A Receita Federal do Brasil é uma das mais eficientes do mundo e seus auditores são selecionados de forma rigorosa. Prova disso é o crescimento da arrecadação ao longo dos anos, mesmo nas épocas em que a economia estava quase estagnada. O país parava, mas a arrecadação continuava crescendo. Como é pouco provável que os contribuintes ficassem mais patriotas quando ganhavam menos , a explicação está no crescimento da carga tributária e no funcionamento dos controles fiscais. Assim, soa ridícula ou pelo menos curiosa a afirmação de que existiria na RFB um setor de inteligência , uma vez que os fatos atestam que não há nessa área do serviço público ninguém que possa ser considerado intelectualmente prejudicado ou, como se diria vulgarmente, não há nenhum burro que tenha sido aprovado nesses concursos. Assim, a palavra inteligencia foi usada no sentido de órgão de espionagem, quase sempre uma fábrica de provas ilícitas. Tais considerações colocam em discussão a possibilidade de que, mais uma vez, o Fisco possa lavrar autos de infração de grandes proporções, caso não leve em conta certas regras básicas que norteiam a atividade tributária. Pode ser que para fortalecer reinvidicações salariais de funcionários, justificar aumento do numero de servidores ou desviar a atenção do povo de outras questões, criem-se ações fiscalizatórias de grande repercussão na mídia e nenhum resultado prático na arrecadação. Muitas empresas importadoras já foram acusadas de subfaturamento. Uma delas sofreu auto de infração cobrando mais de trezentos milhões de dólares a títulos de impostos e multas. O caso teve repercussão na mídia , mas o contribuinte conseguiu provar a regularidade de seu procedimento já na esfera administrativa. O próprio fisco reconheceu que estava errado, que não havia provas do subfaturamento. No caso mencionado as mercadorias eram veículos, cujo preço de mercado pode ser conhecido com muita facilidade no mundo inteiro. Mas avaliar ou arbitrar valor de mercado para certas mercadorias como matérias primas, tecidos, roupas, brinquedos, calçados, bijuterias, peças, etc. é quase impossível. Nessas mercadorias há valores agregados de difícil quantificação, relacionados com as respectivas marcas ou “grifes”, excesso momentâneo de oferta no mercado, uso de estoques de mercadorias de modelos antigos, fora de linha, dificuldades financeiras do exportador, instabilidade política no país de origem, etc. Tudo isso interfere no preço da mercadoria no mercado internacional. Por isso é que uma acusação de subfaturamento só se sustenta com base em prova evidente, clara, insofismável, ou seja, com a prova documental de que houve um pagamento por fora , um conluio entre importador e exportador. Sem uma prova robusta, o que existe é fantasia, presunção, hipótese, ou seja, nada que valha como prova. Um automóvel Mercedes é um automóvel Mercedes, aqui ou em qualquer lugar. Mas certas mercadorias tem preços diferenciados não só em função da marca ou “grife” que trazem de fábrica, mas também do lugar onde são vendidos no varejo. Eu mesmo comprei um relógio certa vez, com nota fiscal e garantia numa loja do centro da cidade, pela metade do preço que me pediram num shopping. A loja da cidade não subfaturou, mas apenas deixou de cobrar os custos que não tem por ser uma loja simples, administrada pelo próprio dono e seus familiares, localizada num prédio modesto. O subfaturamento, seja na importação ou nas operações de mercado interno, passa, necessariamente, por duas etapas: primeira, o conluio que deve existir entre o adquirente e o fornecedor; segunda, a prova de que aquele tenha pago a este uma diferença entre o valor real da operação e o valor “subfaturado”. Já observamos casos em que não havia qualquer prova razoável seja do conluio, seja do pagamento da diferença. E, como é curial, cabe ao Fisco fazer a prova dos fatos que alega, não podendo a autuação basear-se em meros indícios ou presunções. Nesse sentido, há inúmeras decisões tanto de tribunais administrativos quanto judiciais, podendo ser citadas as seguintes: “Indício ou presunção não podem por si só caracterizar o crédito tributário.” (2º Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, acórdão 51.841, in “Revista Fiscal” de 1970 , decisão nº 69). “Processo Fiscal – Não pode ser instaurado com base em mera presunção. Segurança concedida.” (Tribunal Federal de Recursos, 2ª Turma, Agravo em Mandado de Segurança nº 65.941 in “Resenha Tributária” nº 8) Invariavelmente, as autuações relacionadas com “sub faturamento” são precedidas de diversas diligências, realizadas sem que delas o contribuinte autuado tenha sido previamente notificado. Nesses casos, as provas assim obtidas podem ser questionadas, pois a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LV, ordena que: “LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.” O chamado “princípio do contraditório e ampla defesa”, consubstanciado no dispositivo constitucional acima transcrito, não se compadece com qualquer mecanismo de procedimentos em que atos processuais se realizem sem a presença do acusado e sem que se lhe permita contraditar testemunhas ou “depoentes”. A questão das diligências fiscais, ou “investigações” como gostam de usar os agentes do Fisco, está regulada no Código Tributário Nacional, cujo artigo 196 é bem claro: “Art. 196 – A autoridade administrativa que proceder ou presidir a quaisquer diligências de fiscalização lavrará os termos necessários para que
Artigo acerca da natureza do Antidumping
Antidumping reduz oferta de bens e afeta produção POR KLAUBER CRISTOFEN PIRES (Analista Tributário da Receita Federal do Brasil) CONJUR Enquanto o Brasil for a ilha da fantasia keynesianista, muito ainda haveremos de sofrer, pelas injustiças que o estado brasileiro há de causar a nós mesmos e aos nossos compatriotas. Na notícia “Ministério volta a usar dados da Receita no combate à concorrência desleal”, publicada no dia 23 de março, a Agência Brasilanuncia que os dados fiscais, especialmente os relativos às operações de importação, serão encaminhados da Receita Federal do Brasil para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, com a alegação de serem usados no combate à concorrência desleal. Sempre que o estado inova ao tomar medidas restritivas dos direitos civis e da propriedade privada da população, ele o faz mediante a promessa solene de que os dados ou o patrimônio que passará a manipular serão utilizados exclusivamente para os fins até então propostos. Esta é a parte do mingau que está mais na borda, e portanto, fria. Logo, logo, ele chegará ao centro do prato. Foi assim quando se abandonou o padrão-ouro, primeiramente garantindo o resgate total das células, depois parcialmente, até que enfim o papel-moeda tornou-se de circulação forçada, totalmente inconversível. Foi assim quando se criaram os impostos e contribuições sobre o faturamento e o lucro, a nulificar expressa cláusula do Código de Direito Comercial de 1850 que assim estipulava no seu artigo 17: “Nenhuma autoridade, juízo ou tribunal, debaixo de pretexto algum, por mais especioso que seja, pode praticar ou ordenar alguma diligência para examinar se o comerciante arruma ou não devidamente seus livros de escrituração mercantil, ou neles tem cometido algum vício”. Foi assim quando foram criadas a CPMF e a Cide, sob juras de amor à pátria de que seriam usadas tão somente para as áreas de saúde e na recuperação da malha viária, respectivamente. Quais os motivos que podem levar alguém a praticar um preço inferior ao seu próprio custo ou ao preço normal de mercado? Ora, a situação de liquidar um bem cuja manutenção demasiada nos estoques já se tornou antieconômica já é bastante explicativa. Há casos, tais como as passagens de avião, que a iminência da decolagem torna desejável a venda a qualquer preço, quer seja para arrecadar qualquer valor que ajude a pagar o combustível mas também com a expectativa ao menos de se formar uma nova clientela para os próximos voos. Possivelmente a melhor literatura sobre o assunto seja da autoria do professor Domick Armentano, autor de duas elucidativas obras: Antitrust: a case for repeal e Antitrust and Monopoly: Anatomy of a police failure. Nestas obras, o autor investiga os 50 maiores casos de processos contra empresas americanas sob a alegação de promoverem concorrência desleal, e demonstra com dados precisos que estas entidades, na verdade, estavam promovendo melhorias na alocação de recursos econômicos, cujos principais resultados haviam sido astronômicos aumentos de produção e vertiginosas quedas de preço, sem dizer da incrível melhoria tecnológica dos seus produtos. (…) As combinações de preços e de redução de estoques ou de estabelecimentos (cartéis e trustes), a participação majoritária no mercado (domínio econômico), as estratégias ousadas de vendas (dumpings) tão alardeadas em teoria têm mostrado que empiricamente são ineficazes quando postas em prática em um mercado verdadeiramente livre, desde que os demais agentes envolvidos no processo aprendem a se adaptar. Preços altos atraem concorrentes, de modo que o praticante de dumping não tem como garantir um mercado monopolístico para si, mesmo que eventualmente tenha sido bem-sucedido. Por outro lado, preços altos também atraem soluções alternativas: se o feijão preto está caro, os consumidores podem substituí-lo pelo marrom ou pelo grão-de-bico ou quiçá, pela soja. Quando os Rockfellers implementavam uma política de preços de combustíveis abaixo do custo, seus concorrentes fechavam suas bombas, de modo que eles se viam forçados a suportar todo o prejuízo sozinhos. Quando mudaram de estratégia para começar a comprar estabelecimentos de perfuração de poços e vendas de combustíveis, seus concorrentes começaram a abrir firmas da noite para o dia, só para vender-lhes. E foi assim até que, depois de muito prejuízo, desistiram da ideia de “dominar” o mercado. Como bem ensinado por Armentano, grande parte da legislação antitruste nasceu por iniciativa de empresários incompetentes que visavam utilizar-se da força do estado para manter uma reserva de mercado para os seus empreendimentos mal-sucedidos. A doutora Mary Bennet Petterson pegou bem o espírito da coisa ao enunciar: “o que a lei antitruste visa não é proteger a concorrência, mas os concorrentes” (The Regulated Consumer, 1971). Porém, o que significa proteger concorrentes a pretexto de proteger a concorrência? O primeiro resultado concreto da aplicação de um programa dedumping é enriquecer os consumidores, já que com a economia que realizam podem adquirir mais de outros produtos à disposição no mercado. Logo, os efeitos mais visíveis e realizáveis de medidas antidumping são a diminuição da oferta de bens, o encarecimento e o sucateamento da produção nacional, que se vê protegida do único julgamento realmente legítimo em um sistema de livre mercado: o crivo do consumidor. E, de quebra, temos o sigilo fiscal jogado na lata de lixo, com todas as consequências para a corrupção e para o estabelecimento de outras nefastas medidas interventivas governamentais.